TEMPO


Os dias correm pesados, como se demorassem mais a passar. E há uma urgência em que o tempo passe para sentir tudo a acalmar.
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Ainda te tenho tão presente… tão intensamente presente. Devia guardar ao fundo de mim a tua memória. Mas trago-te sempre à flor da pele. Saboreio cada momento que tivemos juntos, de novo. E tudo o que descobri, em ti. Saboreio o amor que senti passar de um para o outro, e que noutros tempos havia sentido viver sozinha.

Um destes dias li numa crónica* sobre O Amor e o Tempo estas palavras: «O problema do amor é o tempo. O tempo é, aliás, o problema de todos os sentimentos e actos da vida, o inescapável fantasma. O amor é a única possibilidade de transcendência temporal que nos é dada - não porque dure toda a vida mas por ser "infinito" enquanto dura, como escreveu Vinicius de Moraes. (…) "Tu és a minha casa, contigo eu sou livre" - diz o amante a Lady Chatterley, no belíssimo filme de Pascale Ferran, inspirado no clássico de D. H. Lawrence. O sexo levou este par de amantes à paixão, a paixão conduziu-os ao amor, a uma visão mais lúcida e radical da existência, e ao êxtase espiritual da liberdade partilhada. Por isso o filme acaba com um sim: "Chamar-me-ás se te sentires infeliz sem mim, mesmo que daqui a muito tempo?" Sim, diz ele. Falta-nos hoje essa capacidade de nos entregarmos primeiro, sem medo, e de cobrir de flores o corpo amado, como se não houvesse outro corpo nem outra terra no mundo - e de então escolher a eternidade infinita desse momento como destino imóvel, para lá das mil circunstâncias e corpos da vida, num simples e imortal sim.»

Acho que nos faltava isso. E de certa forma agora o temos.

Past is history, future is a mystery, and present is a gift… E assim é. Este presente deixa de ser para nós, juntos. Porque as circunstâncias e os corpos da vida reclamam que nos afastemos. E sem vontade nos afastamos. E por ser sem vontade custa tanto. E por custar tanto queria que o tempo passasse mais depressa.

Ainda penso em tudo o que não tivemos oportunidade de viver juntos… abre-se uma janela de sonho, imaginando que hipoteticamente no futuro ainda nos possamos (re)descobrir. Mas o futuro é mistério e o presente faz-se de ausências. Ausência da tua presença, das tuas palavras, do teu corpo, do teu cheiro, teu beijo, do teu toque, da concretização do desejo que nos consome… Quero-te tanto que não o consigo calar. Nem mesmo para te ajudar a fazer de conta que eu não existo.

Mas o tempo há-de passar.

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Pic. “last of our happy summer days” by hbynoe
* O amor e o tempo por Inês Pedrosa

6 comentários:

Azul disse...

Pouco mais há a dizer...

ADOREI!

Beijinho

Azul

Unknown disse...

"Devia guardar ao fundo de mim a tua memória. Mas trago-te sempre à flor da pele."
Adorei esta frase...!




...dizes: "Mas o tempo há-de passar"... Sim, o tempo passa. Mas há coisas que ficam para sempre, mesmo que apenas num fundo muito fundo de nós, como o brinquedo velho que deixamos no sótão, perdido à muito tempo.
Há marcas que nem o tempo apaga... por nos terem marcado tanto!



Bonito texto! Bonito blog! A tua escrita faz-me pensar... cada texto tem muito sentido. Continua a escrever! Continuarei a ler.

Beijinho,

Rita

Esmeralda disse...

Queres que o tempo passe?
Querem que o tempo passe?

Porquê? Porquê tem tudo que ser difícil?
Porque não por o AMOR à frente de tudo? Porque não?
Amor forte assim, não passa num segundo, não passa com o virar de uma nova página, perdura.
Perdura e dói…
Que vença o sentimento, que vença o AMOR!

beijocas

Brain disse...

Este post,
Está absolutamente Extraordinário!

Não consigo dizer mais nada.
PLENO!

Um Beijo meu

Brain disse...

Só para te dizer que voltei.
Que já li e re-li este teu post,
Que está absolutamente fantástico nas tuas palavras.

Pronto. Prometo tentar conter-me para não voltar a comentar.

Um Beijo meu.

Raquel Branco (Putty Cat) disse...

Olá

Este texto trouxe-me a curiosidade de te visitar.
Deixa-me que te diga que tens um belo espaço de escrita.

Fusão de sentimentos na nossa memória tão presente, tão dolorosamente presente.

Beijo grande.

Decerto voltarei.

putty cat